Falar em público

Maria Angélica de Oliveira
Lucélia de Lima


   Falar entre pessoas (para o público e em público) deveria ser algo tão natural como respirar. Em uma prova oral, por exemplo, ou em uma conferência, o ato de falar é exatamente o mesmo exercido em outras situações mais informais. Quero dizer: há o mesmo movimento de elaborar, ponderar sobre o que dizer, escolher as melhores palavras, articular e produzir um enunciado. Contudo, cerca essa ação de se comunicar para outras pessoas um peso emocional tão grande que há quem fique completamente mudo nessas horas.

  Não quero discutir as causas culturais desse comportamento. Mas, com certeza, ele não é circunscrito a um só local, nem a um só tempo. Os cuidados envolvidos na ação de se comunicar com outros, traduzidos na quantidade de material escrito sobre o assunto, dão-nos a dimensão de que fazê-lo tem nos seguido durante grande parte de nossa existência registrada e em grupo.

   Entretanto, ainda há entre nós a mobilização do medo que cerca essa ação. E é contra essa sensação que nos colocamos. Não podemos permitir que esse afeto seja maior do que a importância que há em pronunciar a própria palavra, em deixar na comunidade de que fazemos parte a nossa contribuição marcada pelo som da nossa voz, pela identidade de nosso enunciado. Se nós somos lembrados pelo que fizemos, e se para ser lembrados precisamos, além de fazer, mostrar o que fazemos, é pelo registro da nossa voz no mundo que deixaremos a marca de nossa presença entre os nossos. Mas para isso é fundamental que o nível de comprometimento com o que fazemos seja muito alto.

   Partimos então para uma outra vertente muito importante: falar em público significa comprometer-se com o dito, atuar na esfera do fazer político posicionando-se. Lembrando que não dizer também é concordar com o que é feito. Isso mesmo. Se me calo, demonstro minha concordância. Mas também evidencio a minha indiferença pela transformação, pelo outro lado da questão.

   Assim, se nos importamos com o outro e conosco, se queremos fazer desse um mundo, uma população  que compartilha direitos e deveres, possível, um mundo de lutas com regras cada vez mais justas em que a palavra de cada um possa ser relevante para a construção do espaço público de todos é fundamental não se esconder atrás da cortina e esperar que o outro se manifeste e aja, que o outro destrua o que há de mais relevante: o lugar de cada qual de nós, no sentido da igualdade de direitos. Para que a democracia seja possível, precisamos torná-la possível e a contribuição de cada um de nós é o fio responsável por tramar o tecido dos nossos sonhos, dos nossos planos, dos nossos projetos.



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